VAMOS CACOFATAR?

VAMOS CACOFATAR?
(texto escrito por José Ouverney em 02.10.2018 para o site falandodetrova/com.br)

 
            Um dos inimigos mais comuns e implacáveis de do poeta, você sabe qual é? O pior é que ataca na surdina, com o claro intento de humilhar o pobre “escrevinhador”.  Pois bem, vou lhe dizer: é o cacófato.  Como quem não quer nada, ele vai juntando as palavras que a gente escreve e formando outras, de sons muitas vezes estranhos e desagradáveis, tais como: “amá-la-ia”, “o vinho”, etc.
 
            O mais curioso aconteceu na noite de 02.10.2018. O trovador friburguense Joaquim Carlos, a título de descontrair, postou na rede social uma trova, desafiando os leitores a descobrirem quantos cacófatos ela tinha. Epa, eu falei “ela tinha”?  Eis a trova:

 

Se eu for me já pra essa roça
vou a lembrar, prima minha,
por cada velha carroça
e do amor que dela tinha!
JOAQUIM CARLOS

 
            O mais comum foi as pessoas acharem que havia quatro: 1- “for me já”, 2- “prima minha”, 3- “por cada” e 4- “lá tinha”.  Olhei melhor e descobri que havia seis. De repente passei a achar que eram sete. Não. Pensando bem... são oito.
 
            Aí o autor da trova confirmou que realmente era oito cacófatos, e citou-os um a um. E qual não foi minha surpresa quando vi que entre os oito por ele citados havia três que eu não relacionara e, igualmente, entre os meus oito, tinha também outros três não percebidos por ele.
 
            Cacófatos inicialmente encontrados pelo autor, além dos quatro lá acima citados: 5- “Se eu (seu), 6- “vou a” (voa), 7- “for me” (forme) e 8- “do amor” (doa).  Além destes, encontrei: 9- “pra essa” (pressa), 10- “essa roça” (é sarro) e 11- “velha carroça” (velhaca).
 
            Fiquei pasmo, a ponto de dizer ao Joaquim: - Você é um monstro. Como conseguiu juntar onze cacófatos em uma só trova, composta por apenas 28 sílabas poéticas? E o que é mais interessante: sete foram encaixados propositadamente e outros quatro de forma, diríamos, “quase acidental.
 
            Tive o cuidado de separar esta trova e escrever o presente texto a respeito, por achar o tema didaticamente perfeito para quem for ministrar “Oficinas de Trovas”. Nada mais oportuno do que fazer estas citações, alertando justamente os trovadores iniciantes e até mesmo os veteranos “distraídos” a respeito desse nosso terrível inimigo chamado “cacófato”, que vive sempre à espreita, aguardando um cochilo de nossa parte para aprontar suas traquinagens.
 
            Embora considerando o comentário complementar do magnífico trovador mineiro, Arlindo Tadeu Hagen, que não considera “seu”, “forme”, “voa” e “doa” cacófatos, e sim apenas os que criam sons desagradáveis, ainda assim seriam sete os elementos “estranhos no ninho”.
 
            Xô, cacofonia!  Sai pra lá, coisa feia!