Rua "Trovador Ernesto Tavares de Souza"

(texto de José Ouverney , publicado no site www.falandodetrova.com.br, na coluna:  http://falandodetrova.com.br/ouverneyconverso )

RUA "TROVADOR ERNESTO TAVARES DE SOUZA"

     Todo sábado, depois de uma semana de trabalho, quando eu vinha de Jambeiro (onde trabalhei de 1996 a 2004, até minha aposentadoria), eu tinha o hábito de visitar, na parte da tarde, o casal Ernesto Tavares/Alice Vendramini, que residiam à Rua Major José dos Santos Moreira, bem em frente ao velório municipal. Ali colocávamos o papo em dia, falando de tudo que se relacionasse a Trova. Como os mais próximos sabem, sempre fui crítico, nunca tive papas na língua, mas o amigo Ernesto - de saudosa memória - aprendeu a me estimar tal qual eu sou. Quantas vezes critiquei posturas quanto à condução do "Juventrova", mas ele ouvia tranquilo, entendendo e aceitando os meus pontos de vista, mesmo que não concordasse.

     Mas veio uma época em que deixei de frequentar a sua casa. Sua obssessão por uma aposentadoria militar que não saía, envolvendo marchas e contramarchas em Brasília, foi mexendo muito com sua cabeça e foi diretamente responsável pelo agravamento de alguns problemas com a saúde. Nas últimas vezes em que visitei o casal, Ernesto já não falava em trovas. Parecia ter esquecido todo o áureo período vivido dentro desse mundo encantado de concursos e festas. Só falava da aposentadoria que não saía. E cada vez mais doente. Passou a ser um outro Ernesto.  Até que veio a falecer, no dia 12 de julho de 2005, coincidentemente uma semana após a realização do XV Concurso de Trovas de Pindamonhangaba.

     Mesmo não fazendo parte da diretoria da UBT de Pindamonhangaba, botei na cabeça que haveria de lutar para que o amigo recebesse uma homenagem póstuma, através de uma rua que fosse agraciada com seu nome. Aquilo ficou na minha cabeça.  Assim sendo, três anos depois, em 2008, quando recebi em Nova Friburgo o honroso título de "Magnífico Trovador" e fui chamado, na Câmara Municipal de Pindamonhangaba, para receber um Cartão de Prata, na hora do discurso protocolar rompi com o dito cujo, dizendo que minha maior alegria nem seria o Cartão de Prata que ora recebia e, sim, se a Câmara aprovasse uma indicação para que passássemos a ter em nossa cidade a Rua "Trovador Ernesto Tavares de Souza".   Para minha agradabilíssima surpresa o então Presidente da Câmara, Vereador Jânio Ardito Lerário, respondeu, dizendo que ficasse tranquilo, que meu anseio seria atendido. E que eu procurasse pelo Alexandre "Pió", seu assessor de Câmara, com a documentação necessária.  E assim o fiz.

     Meses depois recebi a confirmação.  Em resumo, apresento-lhes, abaixo, o andamento dos trabalhos que culminaram com final feliz:

 

CURRÍCULO ENVIADO À CAMARA MUNICIPAL, PARA VIABILIZAR UM NOME DE RUA PARA O TROVADOR ERNESTO.  NO FINAL DE 2008 

 
ERNESTO TAVARES DE SOUZA = A TRAJETÓRIA DE UM TROVADOR

 
 
 
            Poeta de grande valor e, sobretudo, um abnegado nas causas que abraçava.
 
            Nascido nesta cidade, no dia quinze de janeiro de 1939, filho de Juliana da Costa Abreu de Souza e Manoel Ernesto de Souza.
 
            Durante oito anos foi professor de alfabetização em Pernambuco.  Fez parte do primeiro pelotão de militares, pela FAB – Força Aérea Brasileira, enviado para Brasília em 1959.  Correspondente, durante vários anos, dos jornais “A Gazeta Esportiva” e “Notícias Populares”. 
 
            Sua vida foi de uma incansável doação a entidades e pessoas às quais serviu.  Como tesoureiro da Academia Pindamonhangabense de Letras, deixou as marcas de sua dedicação naquele “palácio do saber”.
 
            Mas foi como trovador que Ernesto se completou. Como vice-presidente de cultura da União Brasileira de Trovadores – seção de Pindamonhangaba, teve oportunidade de realizar um trabalho social de enorme repercussão.  Foi ele o grande responsável pelo sucesso que hoje é a realização do “Juventrova” – a Trova na Escola - que desde 1995 movimenta milhares de alunos em cerca de duas dezenas de estabelecimentos de nosso município, tendo se tornado a maior realização do gênero, no país.  Indo invariavelmente de escola em escola, ano após ano, era indescritível o carinho dispensado por ele a essa atividade, conseguindo arregimentar inúmeros professores de língua portuguesa e diretores para a causa abraçada.  Incansável incentivador do culto à Trova, conseguiu formar, entre comerciantes do Mercado Municipal, um grupo de seguidores que até hoje participam com entusiasmo, alguns até começando a contabilizar prêmios fora do âmbito municipal.
 
            Tinha a Trova como sua verdadeira devoção.
 
            Discípulo do consagrado poeta/trovador Orlando Brito que aqui residiu entre as décadas de 60 e 70, aprimorou com ele a arte de “poetar”. A ponto de ter acumulado dezenas de troféus em concursos de grande porte pelo Brasil.  Esta trova, por exemplo, foi contemplada em Nova Friburgo, o “Berço da Trova”, em 1997, tema “Janela”: 
 
                                   Janela, a bem da verdade
                                   este ranger... teu chiado,
                                   são gemidos da saudade
                                   na voz rouca do passado.
 
            A cultura de Pindamonhangaba muito deve a este invejável estereótipo de ser humano que, a exemplo de seu patrono São Francisco de Assis, fez da humildade a melhor forma de transportar o seu talento pelos caminhos desse mundo, cuja jornada foi interrompida no dia doze de julho de 2005, quando o nosso Pai Maior exigiu a sua presença em outra dimensão.
                                   A vida, a vida o que é,
                                   se não uma curta história,
                                   que brinda um homem de fé
                                   ao final da trajetória?
 
            Foi esta mesma fé que levou Ernesto Tavares de Souza a escrever no livro de sua terra natal mais uma página de raro brilho.  
 
            Teve em Dona Alice Vendramini sua mulher e fiel companheira até os últimos instantes. Deixou irmãos e sobrinhos. E muitos amigos.  Mas não deixou filhos.

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RECEBIDO DO ASSESSOR DA CÂMARA, ALEXANDRE ‘PIÓ”, DOIS MESES DEPOIS:
 
19/12/2008
Alexandre:      Prezado amigo José
Desculpe-me pela demora... venho informar que por sua inspiração e através do nosso amigo Jânio, Pindamonhangaba já tem uma via pública homenageando Ernesto Tavares de Souza - Trovador. A lei já foi aprovada segunda-feira, passa na Câmara para a gente conversar.
abraços
 
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Realmente a homenagem se efetivou e hoje nós temos, no Residencial Primavera, em Moreira Cesar, a Rua Trovador Ernesto Tavares de Souza, Cep 12.245-300.

 

CEP 12445-300
Rua Ernesto Tavares de Souza - Residencial Primavera
Pindamonhangaba - São Paulo

 
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 CORRESPONDÊNCIA ENVIADA AO PRESIDENTE DA UNIÃO BRASILEIRA DE TROVADORES À ÉPOCA:

                                            Ilmº Sr
                                            EDUARDO A. O. TOLEDO
                                            DD Presidente Nacional da UBT
 
 
               Envio, anexos, documentos comprobatórios de um trabalho que levei avante em Pindamonhangaba, visando dar nome de rua ao trovador Ernesto Tavares de Souza, falecido em 2005, considerado o “Pai do Juventrova”.  Paralelamente ele desenvolveu um brilhante trabalho nas diretorias da Academia Pindamonhangabense de Letras e da UBT Pindamonhangaba, às quais também encaminhei cópias dando conta do sucesso da iniciativa tomada, visando eternizar o nome de um amigo que sempre foi um autêntico exemplo franciscano de humildade e perseverança.
 
               Cópias também estão sendo enviadas à Presidente Estadual da UBT São Paulo, posto que vejo no êxito da iniciativa um voto de grande valorização ao que é feito em prol da Trova.
 
               Sendo só o que me ocorre no momento, subscrevo-me
 
 
Atenciosamente, 
 
JOSÉ  OUVERNEY
         
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     NOTA FINAL = Dos ofícios que enviei, não recebi resposta de nenhum, nem vi citação em reuniões ou informativos. Mas este nunca foi o meu propósito: fiz o que fiz, ciente de que foi por uma ótima causa e para fazer justiça a um amigo que sempre trabalhou no anonimato e nunca se preocupou em assinar o que fazia. Nunca visou nada em troca, a não ser a alegria de ver a bandeira da Trova no mais alto dos pedestais.

     Heróis se fazem também assim. E Ernesto foi um deles...

Texto publicado em 02/11/2014.